De casa, Maria Elizete Kunkel, física e professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), coordena o trabalho disperso por 1.300 impressoras em todo o país. Reunidas no Projeto Hígia, pesquisadoras e mulheres profissionais da impressão 3D formaram uma rede para enviar protetores faciais reforçados a hospitais com trabalhadores da saúde que lidam com pacientes infectados pelo novo coronavírus.
“O modelo foi desenvolvido com orientação de um médico pneumologista, porque queríamos fazer algo que realmente fosse necessário no contexto brasileiro”, explica Kunkel.
Ela passa horas online tirando dúvidas, orientando voluntários e ouvindo relatos dramáticos que chegam de hospitais: falta de pessoal para tratar pacientes e escassez de equipamentos de proteção para os profissionais são os mais comuns.
As primeiras entregas dos protetores faciais começaram a ser feitas. Nesta quinta-feira (26/03), unidades impressas chegaram a um hospital que trata crianças com câncer e com covid-19 no interior de São Paulo. Os pedidos ao Projeto Higia já ultrapassam a marca de 300 mil unidades.
“Começamos a trabalhar com o material que usávamos nos laboratórios para pesquisa. Agora recebemos doações de empresas, como folha de acetato, e colaborações em dinheiro por meio de uma vaquinha”, detalha Kunkel. “Tem muita gente querendo ajudar.”
No quarto de Laura Helena de Melo Passoni, de 19 anos, duas impressoras trabalham dia e noite. “Participei do desenvolvimento do projeto e fico muito feliz de poder contribuir num momento tão crítico e importante”, diz a estudante de biomedicina enquanto fiscaliza o arco de um protetor facial que acaba ser impresso.
Ciência à frente
Sem recursos, a comunidade científica se mobilizou. Num laboratório de segurança que permite a manipulação de vírus perigosos dentro da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a equipe do pesquisador José Luiz Módena desenvolve um teste rápido de detecção da covid-19.
Em resposta à pandemia, uma força-tarefa formou-se em várias universidades. Na Unicamp, já são mais de 400 voluntários. As pesquisas se distribuem em frentes como testes, diagnóstico, previsão de cenários da pandemia, entre outros.
“Desenvolvemos um teste como recomendado pela Organização Mundial da Saúde para que apresente um resultado definitivo, sem necessidade de contraprova”, detalha Marcelo Alves da Silva Mori, que coordena a força-tarefa na Unicamp. O objetivo é acelerar a investigação dos casos suspeitos e atender pacientes de cidades do interior paulista.
Com lições aprendidas durante a epidemia de zika, em 2015, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), reagiu rápido à ameaça do coronavírus. O órgão está incentivando pesquisadores apoiados pela fundação a redirecionar recursos ao combate da covid-19.
“O principal é que estamos esperando propostas que possam oferecer resultado em tempo curto ou médio para poder fazer efeito na crise atual”, comenta Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp.
Segundo Brito Cruz, capacidade não falta à ciência nacional. “Os pesquisadores conseguem responder rapidamente porque não estão começando a fazer isso agora. Tem investimento de tempo e esforço de quem atua em ciência há algumas décadas para aprender e saber coisas sobre vírus, corona, genoma, anticorpos”, afirma. “O investimento em ciência não pode parar. A pandemia só comprova isso.”
Reação na indústria
Apesar de estar sob a sombra da desaceleração da economia, a indústria brasileira também tem dado respostas à pandemia. Setores diversos, como o de cosméticos, têxtil e de bebidas, adaptaram suas linhas de produção.
O reforço na fabricação de álcool em gel, que ajuda a evitar a infecção pelo vírus, veio de empresas como Avon, Natura, The Body Shop, Aesop e Ambev. Usinas de cana-de-açúcar também passaram a produzir e distribuir álcool 70%.
A fabricação e manutenção de respiradores, equipamento essencial para tratar pacientes graves, assim como testes rápidos de detecção, viraram uma das prioridades de empresas reunidas na Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Após lançar um edital de inovação para selecionar projetos, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), por sua vez, concedeu 10 milhões de reais a seis iniciativas que propuseram soluções contra a pandemia e que devem apresentar resultados em até 40 dias.
“Houve um comprometimento espontâneo, até voluntário, de muitas unidades do Senai para responder à pandemia. Um cenário como este coloca a proteção da sociedade brasileira, que somos todos nós, em primeiro lugar”, diz Rafael Lucchesi, economista e diretor do Senai.
Do ramo têxtil, incluindo fábricas de lingerie, a ajuda vem com confecção de aventais e máscaras para profissionais de saúde. Em Santa Catarina, indústria e moradores se reuniram para fabricar 30 mil máscaras que serão distribuídas em farmácias e postos de saúde.
“Montamos um tipo de máscara com quatro camadas antibactericidas. Ela não é uma máscara cirúrgica, mas ajuda como barreira física e protege boca e nariz”, diz sobre a iniciativa Eduardo Habitzreuter, empresário e engenheiro têxtil de Joinville.
A voluntária Sueli Izidoro, de 58 anos e moradora de Brusque, passa os dias ocupada. “Em dois dias, eu e um casal de vizinhos costuramos 600 máscaras. Eu passei meu aniversário fazendo máscaras e estou muito feliz. Espero que elas contribuam para que as pessoas fiquem saudáveis e longe do vírus”, diz.
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Autor: Nádia Pontes, Hyury Potter / DW