Se não houvesse uma rejeição à vacina da chinesa Sinovac e do Instituto Butantan incentivada pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, o Brasil já teria iniciado seu plano de imunização contra Covid-19 em dezembro. Essa é uma das conclusões do diretor do Instituto, o médico Dimas Covas. “É um conjunto enorme de bobagens que foram usadas e acabaram atrasando o processo de desenvolvimento da vacina”, disse o dirigente em entrevista ao programa Poder em Foco, do SBT, da qual o EL PAÍS participou.
Dimas Covas relatou que foi pego de surpresa quando o Governo federal decidiu incorporar a Coronavac no plano nacional de imunização quatro dias antes do Butantan solicitar à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a autorização para uso emergencial da vacina. Em mais de uma ocasião, o presidente Bolsonaro vetou a compra do imunizante por questões políticas, o instituto é vinculado ao Governo de São Paulo, que é administrado por João Doria (PSDB), seu antigo aliado e agora adversário. Só mudou de ideia quando notou que estava sem opções para vacinar e que a opinião pública começava a se virar contra ele.
“No fundo, no fundo, como as outras iniciativas não foram à frente, como a vacina da Índia não veio, como a vacina da AstraZeneca não chegou, não sobrou outra alternativa, a não ser a incorporação dessa [Coronavac]”, disse o médico, na quinta-feira. Na sexta-feira, chegaram as primeiras vacinas da AstraZeneca da Índia e elas começaram a ser aplicadas e distribuídas pelo país.
Ao ser instado a apontar erros e acertos dos governantes nessa pandemia de coronavírus, o diretor só elencou os equívocos. Disse que o primeiro deles foi o de “menosprezar a gravidade da pandemia”. “Essa pandemia nunca foi uma gripezinha, pelo contrário”, afirmou em referência à fala do presidente Jair Bolsonaro no início da crise, em março do ano passado.
A ausência de uma de uma autoridade central na coordenação das ações contra o avanço da doença também é alvo de críticas de Dimas Covas. “Com a saída do [Henrique] Mandetta do Ministério da Saúde, a coordenação passou a inexistir. A falta de uma organização central, deixou os Estados, num cenário de cada um por si”. Sobre as falhas cometidas pelos governadores, ele disse que faltou uma dedicação maior na política de distanciamento social. Mais de 217.000 pessoas já morreram no Brasil por conta da doença. É o segundo país do mundo com mais mortes, atrás apenas dos Estados Unidos.
Diante da dificuldade em importar insumos, em decorrência de um impasse diplomático causado pelo Governo Bolsonaro, Dimas Covas diz que o cronograma do Butantan segue inalterado. Conforme disse, além das 6 milhões de doses entregues ao Ministério da Saúde, já há mais quatro milhões de doses prontas a espera da autorização da Anvisa para serem disponibilizadas.
Além disso, disse ainda o diretor, assim que os insumos chegarem será possível produzir mais 8 milhões de doses no intervalo de 20 dias. Ainda no primeiro semestre, o Butantan deverá disponibilizar 46 milhões de vacinas para a União. Há a intenção do Governo Federal de adquirir mais 54 milhões até o fim do ano. O Butantan também espera importar o imunizante para outros países sul-americanos.
Na entrevista, o diretor ainda sinalizou que, se for autorizado pela Anvisa, o instituto deve concluir neste ano um medicamento para combater o coronavírus. É o que ele apelidou de “vacina instantânea” e que deve ser prescrita apenas para as pessoas que estejam com covid-19. Não é algo preventivo. “Se dependesse de mim, já estaria em uso. Se eu pegar covid-19 e tiver uma necessidade, eu já autorizo esse soro seja utilizado em mim”, disse em tom de brincadeira.
*Com informações do El País