Martín Vizarra terá um grande desafio ao assumir a Presidência do Peru

LIMA — Até então vice-presidente, Martín Vizcarra deverá assumir a Presidência do Peru nas próximas horas, depois de Pedro Pablo Kuczynski, também conhecido como PPK, se demitir do cargo. A renúncia veio horas após a divulgação de um conjunto de vídeos em que ele escuta o ministro dos Transportes e Comunicações, Bruno Giuffra, oferecer obras aos congressistas do bloco de Kenji Fujimori em troca de votos contra o impeachment por envolvimento com a empreiteira brasileira Odebrecht.

O analista político Enrique Castillo considerou que o ex-governador regional de Moquegua deveria armar “com grande inteligência” um novo Gabinete, cujos membros sejam capazes de estabelecer pontes de diálogo com diferentes setores.

— Um dos seus primeiros desafios será enfrentar a resistência interna. Inicialmente, a ministra e segunda vice-presidente (Mercedes Araoz) disse que iria sair, portanto, Martín Vizcarra seria deixado sem um vice-presidente. Ele terá que recompor completamente o Gabinete, porque todos os ministros fecharam fileiras com Kuczynski e praticamente queriam forçar Vizcarra a deixar o cargo — disse.

Castillo explicou que o novo Conselho de Ministros não precisa ser multipartidário ou de ampla base, mas capaz de se unir.

— E isso talvez se consiga mais com figuras independentes do que com integrantes dos partidos, porque é exatamente aí que está a resistência. Vizcarra terá inteligência e sagacidade para formar uma equipe com personalidade, autoridade e liderança — acrescentou.

Castillo não acredita que todos os membros da bancada Peruanos pela Mudança deem as costas a Vizcarra, porque ele não está tomando posse devido a “um golpe de Estado”.

— Ele está assumindo numa sucessão constitucional e legal. Virar as costas para Martín Vizcarra é virar as costas para o país — disse ele.

O professor de Ciências Políticas da Pontifícia Universidade Católica do Peru (PUCP), Fernando Tuesta, argumentou que, com a saída de Kuczynski, o governo dos Peruanos pela Mudança “havia terminado”.

— Isso mostra um dos aspectos prejudiciais das formas como as chapas (presidenciais) são formadas nas eleições. Constroem com base em suas necessidades eleitorais e não para governar.

Para Tuesta, Martín Vizcarra deve tomar medidas concretas para evitar depender do fujimorismo que Keiko Fujimori representa, ainda que isto seja difícil porque, a seu ver, a bancada de Kuczynski ou que lhe resta, pode passar para a oposição.

Uma opinião semelhante tem Arturo Maldonado, doutor em Ciência Política pela Universidade de Vanderbilt (Estados Unidos). O analista disse que Vizcarra corre o “risco de ser uma figura decorativa, enquanto aqueles que realmente governam são os da Força Popular”.

— Nesse sentido, um de seus desafios é criar um espaço, marcar sua equipe com mais ministros políticos e até antifujimoristas. Eles têm que estabelecer uma agenda legislativa, propor uma série de leis a serem promovidas — disse ao “El Comercio”.

O FATOR KEIKO

Maldonado acredita que, se Martín Vizcarra buscar o diálogo com a líder da Força Popular, Keiko Fujimori, ele deve evitar mediadores e não ter “a atitude submissa” de Kuczynski.

— Vizcarra pode criar uma imagem e um discurso nos quais seja ele quem propõe à Força Popular e diga “vamos fazer isso”. Vizcarra deve aproveitar esses primeiros meses, em que será intocável, para impor condições.

Já Castillo observou que não seria apropriado ao ex-ministro buscar um diálogo diretamente com a Força Popular, porque pode levantar suspeitas.

— É sempre conveniente que um presidente tenha a capacidade de dialogar com todos os setores, mas Martín Vizcarra é suspeito entre aspas de agir pelas costas de Kuczynski com o fujimorismo. Então, dialogar neste momento pode ser visto como a confirmação dessas conversas.

Por sua vez, o analista político Luis Nunes disse que é provável que o ex-ministro dos Transportes e Comunicações lance “um ramo de oliveira” à oposição para que o deixe governar.

— Além do ramo de oliveira, que seria o plano A, imagino que ele tenha um plano B, e isso seria: ou o deixariam governar ou dissolveria o Congresso e convocaria novas eleições — concluiu.

Fonte: O Globo