Madri pode intervir em crise política na Catalunha

 

Após a realização do referendo sobre a independência da Catalunha domingo, que pode levar o governo regional a declarar a secessão da Espanha ainda esta semana, o ministro da Justiça espanhol, Rafael Catalá, afirmou à rede TVE que fará tudo o que a lei permite para que não haja a secessão da região autônoma e ameaçou usar o Artigo 155 da Constituição, que autoriza o Executivo a adotar as “medidas necessárias” para obrigar uma comunidade autônoma a cumprir suas obrigações, como, por exemplo, dissolver o governo catalão. Ao mesmo tempo, a Europa pressiona por diálogo.

— Se alguém pretende declarar a independência de uma parte do território em relação à Espanha, como não pode, como não está dentro de suas competências, será necessário fazer tudo o que a lei permite para impedir que isso aconteça — disse o ministro.

Uma grande paralisação, agendada para a tarde de hoje, recebeu o apoio de ONGs, sindicatos, instituições culturais e deputados parlamentares, e manifestações são esperadas nas principais cidades catalãs. De acordo com números da Guarda Urbana, cerca de 16 mil universitários se concentraram na Universidade de Barcelona e realizaram uma marcha silenciosa em defesa do referendo. Paralelamente, o presidente regional da Catalunha, Carles Puigdemont, exigiu a saída da polícia nacional e da Guarda Civil da região — mais de dez mil policiais atuaram no combate ao referendo, e outros 6 mil estão de prontidão em barcos ancorados na região.

A crise causada pela realização do referendo ultrapassou as fronteiras da Espanha. O alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad al Hussein, mostrou-se preocupado com os atos de violência policial e pediu uma investigação “profunda e imparcial” sobre as ações de domingo, enquanto a diretora do Escritório para Instituições Democráticas e Direitos Humanos (ODIHR, na sigla em inglês) da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE), Ingibjörg Sólrún Gísladóttir, cobrou das autoridades espanholas garantias ao respeito às liberdades de reunião pacífica e expressão. A Comissão Europeia — acusada por Puigdemont, de virar as costas para as ações do governo central na Catalunha — manteve sua posição e reafirmou que o referendo foi uma consulta ilegal, mas pediu a Madri que dialogue com os separatistas.

— Não fecharei nenhum porta. — afirmou o presidente de governo espanhol, Mariano Rajoy, em pronunciamento. — Sempre ofereci diálogo honesto e sincero, mas dentro da lei e dos limites da democracia.

Para Steven Blockmans, do Centro de Estudos Políticos Europeus em Bruxelas, a Catalunha pode se ver obrigada a recorrer a outras entidades internacionais.

— A Comissão Europeia já não é mais vista pelos catalães como um mediador neutro. Então, esse papel pode ser ocupado pela Comissão de Veneza, um corpo internacional de advogados que reúne todos os membros do bloco europeu — afirmou Blockmans ao “New York Times”. — Nenhuma Constituição é eterna. Foi um desastre para a imagem de Rajoy.

PSOE PEDE DIÁLOGO

Para Albert Royo, secretário-geral do Conselho de Diplomacia da Catalunha (Diplocat), a inércia da Comissão Europeia não poderá se manter diante da indignação internacional com a atuação da polícia espanhola.

— A Comissão Europeia foi quem menos se mexeu durante todo o processo, mas agora órgãos como a ONU e a OSCE falam em violações de direitos humanos; governos europeus pedem diálogo, condenando o uso da força; e o Parlamento Europeu discutirá o tema na quarta-feira — afirmou Royo. — Poderíamos imaginar que não reconhecessem o resultado, mas ninguém pensou que forças policiais seriam usadas contra cidadãos em escolas primárias. É esse o Estado que a Espanha quer nos oferecer?

Os resultados oficiais finais da consulta ainda não foram divulgados, mas estimativas do governo local apontam uma vitória arrasadora do “sim”, com cerca de 90% dos votos. De acordo com Royo, cerca de 800 mil pessoas podem tem sido impedidas de votar, mas, ainda assim, até o fim da semana o Parlamento catalão deverá se reunir para debater os próximos passos, que podem incluir uma declaração unilateral de independência. Segundo o porta-voz do governo regional, Jordi Turull, mais de 2,26 milhões de eleitores votaram.

O presidente de governo recebeu a visita de Pedro Sánchez, líder do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), que pediu a Rajoy que inicie uma negociação imediata com os separatistas. Já Albert Rivera, dirigente do Cidadãos, exortou Rajoy a aplicar o Artigo 155 da Constituição.

— Na prática, o artigo 155 já foi aplicado, e a autonomia está suspensa — afirma Royo. — Mas, como tudo o que o governo central fez nos últimos anos, isso só mobilizou ainda mais os independentistas.

 

Foto: Reprodução

Fonte: OGlobo/CorreioBraziliense


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