O Hamas, um movimento islâmico com atuação política e um braço armado, convocou nesta quinta-feira (7) uma nova intifada um dia depois de o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reconhecer Jerusalém como capital de Israel. A intifada é o termo utilizado para fazer referência à revolta palestina contra a política de expansão do governo de Israel.
“Devemos convocar e devemos trabalhar no lançamento de uma intifada diante do inimigo sionista”, disse o líder do Hamas, Ismail Haniyeh, em um discurso em Gaza, de acordo com a Reuters.
A decisão de Trump é polêmica uma vez que os palestinos reivindicam Jerusalém Oriental como capital de seu futuro Estado e a comunidade internacional não reconhece a reivindicação israelense sobre a cidade como um todo.
Apesar dos diversos apelos da comunidade internacional para que Trump não tomasse essa decisão de reconhecer Jerusalém como capital israelense, Trump anunciou na quarta-feira (6) que pediu ao Departamento de Estado que inicie o processo de transferir para lá a embaixada americana atualmente instalada em Tel Aviv.
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, disse na quarta-feira que o reconhecimento marca “um dia histórico” e “um importante passo para a paz”. Foi uma das poucas autoridades políticas a saudar a decisão de Trump.
Temendo revoltas, porém, o governo de Israel já implementou reforços militares na Cisjordânia após o anúncio de Trump.
Em seu discurso, feito na Casa Branca, Trump afirmou que o anúncio marca “o começo de uma nova abordagem no conflito entre Israel e palestinos”.
“Hoje finalmente reconhecemos o óbvio: que Jerusalém é a capital de Israel”, disse Trump. “Isso é nada mais nada menos do que o reconhecimento da realidade. Também é a coisa certa a fazer. É algo que tem que ser feito. Com o anúncio reafirmo o comprometimento da minha administração com um futuro de paz”.
História do Hamas e as Intifadas
O Hamas é a sigla em árabe para Movimento de Resistência Islâmica. O grupo, que é o maior entre os islâmicos militantes palestinos, defende a criação de um único Estado palestino que ocuparia a área onde atualmente estão Israel, a Faixa de Gaza e a Cisjordânia.
A agremiação surgiu após o início da primeira Intifada contra a ocupação israelense da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, em 1987. Nesta ocasião, crianças que jogavam pedras nos tanques foram mortas por Israel, provocando a indignação da comunidade internacional.
A segunda Intifada começou em 29 de setembro de 2000 e durou quatro anos. Os conflitos deixaram milhares de mortos dos dois lados do lado palestino e israelense.
Em 2006, o Hamas venceu as eleições parlamentares palestinas, o que provocou um racha com o grupo Fatah (fundado pelo líder palestino Yasser Arafat ) dentro da Autoridade Nacional Palestina.
A divisão fez com que o Hamas passasse a controlar a Faixa de Gaza, a partir de 2007, e o Fatah ficasse com o comando da Cisjordânia (atualmente liderada por Mahmoud Abbas). Israel considera o Hamas um grupo terrorista. Eles não dialogam.
Repercussão
O presidente dos EUA recebeu ampla condenação de líderes políticos muçulmanos. Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestina, que governa a Cisjordânia, afirmou que Trump viola “todas as resoluções e acordos internacionais” com a decisão.
O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, considerou que reconhecer Jerusalém como capital de Israel “coloca o mundo, e especialmente a região [o Oriente Médio], em um círculo de fogo”, declarou – a Turquia é um importante aliado militar dos americanos.
Um comunicado do Palácio Real da Arábia Saudita, outro aliado dos EUA, chamou a decisão de “irresponsável”.
Na Europa, os líderes da França, Reino Unido e Alemanha, entre outros, condenaram a mudança da embaixada. Emmanuel Macron chamou o anúncio de “lamentável”, enquanto Theresa May disse que o episódio é “pouco útil” para uma solução pacífica. Angela Merkel sublinhou que Berlim “não apoia essa atitude”.
António Guterres, secretário geral da ONU, afirmou que “não há alternativa à solução com dois Estados, não há plano B”, pela qual o órgão irá continuar trabalhando, segundo a Reuters.
Entre protestos, Trump acirra ânimos com decisão sobre Jerusalém
Ignorando todos os alertas feitos no dia anterior e rompendo com décadas de diplomacia americana, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reconheceu oficialmente Jerusalém como a capital de Israel, reivindicando “uma nova abordagem” sobre o conflito e ordenando o início imediato dos preparativos para a transferência da embaixada americana de Tel Aviv para a cidade sagrada. O anúncio desencadeou protestos em várias cidades turcas, na Faixa de Gaza e na Cisjordânia e recebeu críticas amplas na comunidade internacional, incluindo aliados na região e na Europa. Oito países pediram uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU. Após o pronunciamento, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, comemorou o “dia histórico”. Já Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), lembrou que “Jerusalém é a eterna capital do Estado da Palestina”. Por sua vez, o grupo radical Hamas disse que Trump abriu “as portas do inferno” para os interesses americanos.
No discurso, em que evocou por diversas vezes os “erros cometidos por presidentes americanos no passado”, Trump ainda prometeu que fará todo o possível para um acordo de paz e se comprometeu com a criação de um Estado palestino — sem, no entanto, indicar como a controversa mudança poderia ajudar nesse sentido.
— Presidentes anteriores fizeram desta uma grande promessa de campanha, e nunca cumpriram. É hora de oficialmente reconhecer Jerusalém como capital de Israel. Israel é uma nação soberana com o mesmo direito de outras nações de determinar sua capital. Reconhecer isso é um passo para alcançar a paz — reiterou Trump, que disse ter tomado a decisão para defender os interesses dos EUA.
Mas muitas perguntas ficaram sem respostas. Além de deixar em aberto uma posição sobre as fronteiras finais de Jerusalém, ou sobre a indivisibilidade da capital, como reivindica Israel, Trump pediu que o status quo das áreas sagradas — incluindo o platô que os judeus chamam de Monte do Templo, e os muçulmanos, Esplanada das Mesquitas — seja mantido. O presidente também ressaltou que estava cumprindo uma promessa de campanha, o que mostra a dimensão política interna da decisão. Ele disse que instruirá o Departamento de Estado a contratar arquitetos para iniciar a construção da embaixada imediatamente.
— Não desistimos do acordo de paz. Seria loucura assumir que repetir exatamente a mesma fórmula produziria um resultado diferente ou melhor.
Analistas, no entanto, acreditam que a mudança pode ter o efeito inverso e acirrar ainda mais os ânimos na região, inclusive unindo facções que estavam afastadas contra Israel. John Brennan, ex-diretor da CIA, afirmou que a declaração de Trump foi “imprudente”.
— A decisão prejudica os interesses dos EUA no Oriente Médio nos próximos anos e tornará a região mais volátil — afirmou.
Jared Kushner, conselheiro sênior da Casa Branca e genro do presidente, e o enviado especial Jason Greenblatt, vêm se preparando há meses para uma negociação entre israelenses e palestinos. Os esforços, no entanto, estariam seriamente comprometidos com o anúncio. Em reunião em Bruxelas, o secretário de Estado dos EUA, Rex Tillerson, foi severamente criticado por aliados europeus:
— O presidente está comprometido com o processo de paz no Oriente Médio — rebateu.
Para Abbas, fim do papel mediador dos EUA
Após o anúncio, como era esperado, o premier israelense comemorou a decisão.
— Exorto todos os países que buscam a paz a se juntarem aos EUA e reconhecerem Jerusalém como a capital de Israel e moverem suas embaixadas — convocou Netanyahu.
O secretário-geral da OLP, Saeb Erekat, declarou que Trump “destruiu a solução de dois Estados”. Abbas, por sua vez, disse que a decisão “equivale a uma renúncia da parte dos EUA ao papel de mediador da paz”.
— Acho que esta noite (Trump) está estimulando as forças do extremismo na região como ninguém nunca havia feito até agora — afirmou Erekat.
Para o analista Nir Hasson, do jornal israelense “Haaretz”, o reconhecimento de Jerusalém Ocidental como capital de Israel obrigaria os EUA a também reconhecer Jerusalém Oriental como capital palestina.
— Abbas não pode vender o Estado palestino para o seu povo sem uma capital — explicou o analista sênior do centro de estudos Crisis Group para Israel e Palestina, Ofer Zalzberg, ao “Haaretz”. — O reconhecimento americano significa que, do ponto de vista da Organização para a Libertação da Palestina, não há mais esperança para uma estratégia de negociações.
Após o anúncio, milhares de palestinos protestaram em Gaza e na Cisjordânia. Em cidades turcas e na Jordânia, houve manifestações em frente às representações diplomáticas americanas.
Foto: Mohammed Salem/Reuters
Fonte: O Globo
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