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Nove pessoas — seis manifestantes, um garoto, um policial e um membro da Guarda Revolucionária iraniana — morreram durante protestos noturnos na região de Isfahan, no centro do Irã, anunciou a televisão pública local nesta terça-feira. No total, já são 21 mortos na onda de manifestações iniciada na última quinta-feira em Machhad, a segunda cidade mais populosa do país. Contra as dificuldades econômicas e o autoritarismo do regime de Teerã, os manifestantes saem às ruas em diversas cidades e são reprimidos pelas forças de segurança. Em seu primeiro pronunciamento sobre a crise, o líder supremo iraniano, aiatolá Ali Khamenei, acusou “inimigos do Irã” de interferência no país.

Dentre as novas vítimas fatais, estão um menino de 11 anos, cujo pai foi ferido por disparos de manifestantes, e um homem de 20 anos em Khomeinyshahr. Outras seis pessoas morreram em confrontos com as forças de segurança, quando tentavam invadir uma delegacia da cidade de Qahderijan. Em Najafabad e Kahriz Sang, morreram dois agentes de segurança, que foram atingidos por disparos de fuzis de caça.

— Nos acontecimentos dos últimos dias, os inimigos se uniram e estão usando de todos seus meios, seu dinheiro, suas armas, suas políticas e seus serviços de segurança para criar problemas para o regime islâmico — afirmou Khamenei, em uma declaração transmitida pela emissora de televisão oficial. — Esperam apenas uma chance para se infiltrar e atacar o povo iraniano. O que pode impedir o inimigo de agir é o espírito de coragem, de sacrifício e a fé do povo, dos quais vocês são testemunha.

Também nesta terça-feira, o presidente dos EUA, Donald Trump, voltou a expressar apoio aos manifestantes contra o governo. Mais uma vez, chamou o regime iraniano de brutal e corrupto. Logo que irromperam as primeiras marchas, o chefe da Casa Branca já enviara uma mensagem hostial ao Irã, dizendo que a “a população está cansada da corrupção e do financiamento de terroristas pelo regime”. Os dois países vivem um momento de crise diplomática, agravada pela postura agressiva de Trump, que ameaça abandonar o histórico acordo nuclear entre Teerã e potências mundiais.

“O povo do Irã está finalmente atuando contra o brutal e corrupto regime iraniano”, escreveu o presidente pelo Twitter, um dia após ter dito que havia chegado o tempo de mudança na república islâmica.

Em retaliação, a chancelaria iraniana disse que Trump deveria se preocupar com os milhões de pessoa que passam fome e não têm casas nos EUA:

— Em vez de perder tempo enviando tuítes inúteis e insultantes contra outros povos, Trump deveria ocupar-se dos problemas internos do seu país, em particular o assassinato diário de dezenas de pessoas e os milhões de pessoas famintas e sem casas — disse Bahram Ghassemi, porta-voz da chancelaria iraniana, segundo a imprensa local.

MAIOR CRISE EM OITO ANOS

As mortes agravam a crise no país, que encara as manifestações mais robustas contra o seu regime desde 2009, quando milhões de pessoas saíram às ruas para protestar contra a reeleição do então presidente Mahmoud Ahmadinejad, sob acusações de fraude eleitoral. Agora, desde sábado, pelo menos 450 pessoas já foram detidas em Teerã, das quais 100 foram presas na noite de segunda-feira.

Os protestos políticos são um fenômeno raro no Irã e representam um claro desafio ao autoritarismo do governo, cujas forças de segurança mantém um rigoroso controle sobre a vida da população. Os iranianos saem às ruas para expressar o seu descontentamento com a corrupção e as dificuldades econômicas sofridas pela população. A gota d’água foi o aumento de 40% no preço do ovo e das aves para consumo, a que o governo atribuiu aos receios de uma gripe aviária.

Muitos estão decepcionados porque esperavam que a vida já estivesse mais fácil a esta altura, após o levantamento das sanções internacionais para os setores financiero, energético e de transportes contra o seu país, em decorrência do acordo nuclear com potências mundiais. A economia local já registrou avanços desde 2015, mas os iranianos não veem todos estes progressos chegarem às suas casas. As taxas de desemprego permanecem altas e a inflação voltou ao índice de 10% ao ano.

No entanto, não demorou para que os manifestantes se voltassem também contra o autoritarismo do regime de Teerã. Há anos que a população cultiva uma série de queixas políticas e sociais, inclusive por conta do rigoroso controle das autoridades sobre a vida dos cidadãos. Segundo especialistas, as mulheres têm se tornado um motor cada vez mais importante na luta por liberdades com a sua luta por direitos iguais no Irã. Além disso, muitos criticam o envolvimento do Irã em conflitos regionais.

Assim como em 2009, as imagens e os relatos de jornalistas iranianos sobre os protestos vêm apenas pelas redes sociais, e com muita dificuldade. O governo controla a imprensa e não permite a liberdade de expressão. São poucas as fotografias ou vídeos que chegam a conhecimento público, sobretudo, fora do Irã. E é difícil verificar os fatos que aparecem sobre as manifestações.

Foto: HANDOUT / AFP

Fonte: O Globo