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Câmara dos Deputados aprovou o chamado Marco Legal das Garantias, que facilita a recuperação de bens em caso de inadimplência e, com isso, reduz riscos e taxas de empréstimos. A matéria já havia sido aprovada pelos deputados, mas, como foi alterada no Senado, precisou retornar para o debate na Câmara. Agora, o texto vai para a sanção ou o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A proposta permite, entre outros pontos, que os devedores utilizem um único bem móvel ou imóvel como garantia de diferentes empréstimos. Mas o máximo de operações garantidas por um mesmo bem deverá ser até o valor total da propriedade.

Na prática, a nova regra vai reduzir o risco de inadimplência e, com isso, há expectativa de redução do custo do crédito. Mesmo tendo sido enviado pelo governo passado, a matéria conta com o apoio do Executivo atual.

 Esse projeto tem o objetivo de aumentar e baratear a oferta de crédito, desde que não afete a arrecadação do governo. A essência do projeto é permitir que um imóvel de R$1 milhão, por exemplo, possa ser garantia de mais de uma operação, desde que elas não excedam o valor total do imóvel. Dessa forma, você aumenta a concorrência e a oferta de crédito — disse João Maia ao GLOBO.

O texto veio do Senado com algumas alterações e emendas, parte delas foi rejeitada pelo relator João Maia (PL-RN), enquanto outras foram aceitas.

Maia recusou, por exemplo, a sugestão dos senadores para devolver o restante do valor de um bem leiloado ao proprietário após a quitação do primeiro empréstimo. Dessa forma, o valor arrecadado com o leilão só será devolvido depois que o devedor quitar todos os créditos contratados.

Foi retirado do texto, pelo Senado, a possibilidade de execução extrajudicial de bens imóveis que sejam garantias de operações de crédito. Isso poderia ocorrer, por exemplo, em cartórios. João Maia resolveu deixar de fora este ponto, como sugerido pelos senadores. A exceção será para penhora de veículos automotores, que poderá ser realizada perante os órgãos executivos de trânsito dos Estados.

Já criação de Instituições Gestoras de Garantia (IGG), que seriam intermediárias entre credores e devedores, havia sido aprovada pela Câmara e foi derrubada pelo Senado. João Maia disse que vai deixar o IGG de fora do projeto, como foi sugerido pelos senadores.

O texto original do marco das garantias também permitia que um imóvel único de família fosse penhorado pelos bancos. O trecho foi derrubado pelo Senado e a alteração foi mantida pela Câmara.

Maior oferta de crédito

Para especialistas, o projeto tende a aumentar a oferta de crédito e, potencialmente, melhorar as condições das operações. Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), diz que a garantia de bens aos bancos reduz o risco das operações para as instituições financeiras. Quanto menor o risco, mais facilmente o credor deve aprovar o crédito e mais barato tende ser o empréstimo, avalia ele.

É uma operação (para o banco) extremamente segura. Quando você agrega uma garantia, seja um imóvel ou um carro, o risco é menor. Ele tende emprestar mais, em um prazo mais longo e com uma taxa de financiamento mais barata. Porque sabe que se o devedor deixar de pagar, tem um bem que pode ser usado para pagar a dívida.

O sócio fundador da consultoria Milenium e planejador financeiro da Planejar, Marcelo Milech, diz que a redução de juros pode ser uma consequência indireta da aprovação do marco, mas o efeito depende de condições externas que vão além das mudanças legais. Ele concorda que aumento da disponibilidade e disposição de crédito são consequências diretas que devem vir:

— Se houver mais oferta, consequentemente haverá com mais concorrência e as condições para o tomador de crédito podem melhorar, mas indiretamente. Não necessariamente (o projeto) implica, por si só, em uma redução de juros. Não é um efeito tão objetivo e direto — afirma Milech, que aponta o aumento de liquidez como um efeito positivo que deve vir do novo marco.

Para os consumidores, o diretor da Anefac diz que a garantia real, com um bem, pode aumentar o poder de negociação com as instituições financeiras. Ele lembra, no entanto, que os tomadores de crédito precisam ter em mente que, em caso de inadimplência, o risco é elevado.

— Primeiro, é importante que, ao fazer o empréstimo, o consumidor pesquise as condições para fazer no lugar com as taxas mais baixas. Segundo, ele deve preferencialmente optar por prazos mais curtos, para economizar nos juros. Maso principal é ter consciência do que risco que, se deixar de pagar, é ele pode perder o imóvel. Então é bom ser conservador.

Se a disponibilização de crédito pode aumentar, a alta do superendividamento é uma das consequências negativas que podem vir com o PL, avalia Milech. Ao dar a possibilidade de que um bem seja usado como garantia para diferentes empréstimos, o projeto aumenta a propensão do devedor de contrariar novas dívidas:

— É uma medida louvável, interessante, que destrava patrimônio, capacidade de alavancagem e acompanha legislações que já existem em outros mercados, como EUA. Esse é um lado positivo. Minha preocupação principal é o superendividamento, a pessoa perder o controle das dívidas. Em um mercado em que o credito é caro e escasso, você vai permitir que um devedor ofereça partes de um mesmo bem para diferentes credores. Isso não deixa de ter um lado perigoso.

Financiamento de veículos

Uma outra mudança do PL é para as garantias em financiamento de veículos. Segundo o texto, em caso de inadimplência, o credor deixa de precisar recorrer à Justiça para requisitar um veículo financiando. Na prática, a requisição do bem será acelerada.

— A intenção do PL é agilizar o processo de recuperação de bens financiados, reduzindo a burocracia e o tempo necessário para resolução desses casos. No entanto, essa agilidade também gera preocupações quanto ao direito de defesa do devedor, que teria menos tempo e oportunidades para contestar a ação – diz o advogado Ricardo Motta, sócio responsável pela área de relacionamento com o mercado da Viseu Advogados.

Se aprovada, a nova legislação vai estabelecer um prazo de cinco dias úteis para o devedor regularizar a dívida após ser notificado. Caso o débito não seja quitado, o credor fica autorizado a requerer a busca e apreensão do veículo diretamente a um oficial de justiça, sem necessidade de autorização judicial prévia, explica o advogado.