Justiça de Brumadinho bloqueia R$ 60 milhões de empresas

A Justiça mineira decretou a indisponibilidade de bens, direitos e valores das empresas Tüv Süd Bureau de Projetos e Consultoria Ltda. e Tüv Süd SFDK Laboratório de Análise de Produtos Eirele, solidariamente, até o valor de R$ 60 milhões.

A decisão, em caráter liminar foi tomada pela juíza Perla Saliba Brito, da 1ª Vara Cível, Criminal e da Infância e da Juventude da Comarca de Brumadinho. O processo corria em segredo de justiça, mas na data de ontem, 14 de maio, a magistrada suspendeu o sigilo.

A magistrada determinou ainda, na mesma decisão, a suspensão das atividades da Tüv Süd referentes a análises, estudos, relatórios técnicos e quaisquer outros serviços de natureza semelhante relacionados com segurança de estruturas de barragem.

Estão suspensas também análises de gestão de risco geotécnico (GRG), revisão periódica de segurança de barragem (RPSB), cálculo de risco monetizado e inspeção de segurança regular (ISR).

A suspensão das atividades inclui ainda trabalhos da empresa referentes a auditoria, análise e certificação de sistemas de gestão ambiental, sob pena de multa diária a ser imposta em caso de descumprimento.

Indícios de responsabilidade

Na sua decisão, a magistrada destacou, entre outros pontos, que documentos acostados aos autos indicavam que a barragem que se rompeu teve sua estabilidade garantida em setembro de 2018 pelo engenheiro civil e geotécnico Nakoto Namba, da empresa Tüv Süd .

A juíza destacou que uma declaração de condição de estabilidade assinada pelo engenheiro foi apresentada à Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) e nela constava que a barragem encontrava-se ?em condições adequadas, tanto do ponto de vista de estabilidade física do maciço, quanto do ponto de vista do dimensionamento das estruturas hidráulicas?.

Para juíza Perla Saliba Brito há indícios de que empresas se articularam para encobrir real situação da barragem rompida

A declaração vinha acompanhada de dois apêndices, ressaltou a magistrada: um com a cópia da anotação de responsabilidade técnica (ART), referente ao laudo técnico de segurança da barragem de 2018 elaborado, e outro com as recomendações da auditoria e o plano de ação elaborado pela Vale S.A.

Entretanto, muito embora a Tüv Süd tenha declarado a estabilidade das estruturas da Barragem I, os documentos acostados ao processo indicam que a situação da barragem era crítica quanto ao fator de segurança para liquefação?, disse a magistrada.

A juíza acrescentou haver ?indícios de que funcionários da Tüv Süd, em diversos níveis hierárquicos, cientes da criticidade do empreendimento, se articularam para encobrir a real situação da barragem que se rompeu, visando a manutenção de contratos firmados com a Vale S.A., uma vez que, se não apresentassem a declaração de estabilidade junto ao poder público, as atividades da Mina Córrego do Feijão seriam paralisadas?.

A magistrada citou o teor de e-mails trocados entre funcionários da Tüv Süd sobre a declaração de estabilidade da barragem I da Mina Córrego do Feijão e declarações de funcionários dessa empresa, da Vale e da empresa Potamos.

As provas acostadas aos autos, avaliou a magistrada, se mostravam ?suficientes a demonstrar a existência de fundados indícios de responsabilidade das requeridas, pela prática de ato lesivo à administração pública consistente em dificultar a fiscalização de órgão público?.

O bloqueio determinado, indicou, visa a garantir o resultado útil de eventual aplicação de multa e reparação integral do dano. Para a juíza, a medida é necessária para não haver dissipação patrimonial da empresa, e assim garantir a eficácia/utilidade na decisão final.

Quanto ao pedido de suspensão  - REVISTA MAISJR das atividades, a juíza avaliou ser necessária diante da gravidade dos fatos e da insegurança gerada pela manutenção de algumas das atividades da empresa, ?já que, aparentemente, as informações prestadas ao poder público acerca das condições da Barragem B1, do Córrego do Feijão, não se mostraram fidedignas, e foram realizadas sem a credibilidade e imparcialidade técnicas necessárias?

A denúncia

O Ministério Púbico de Minas Gerais entrou com a ação contra as empresas sustentando que o rompimento da Barragem I, do Complexo Minerário da Mina Córrego do Feijão, ocorrido em 25 de janeiro, não se deu de forma imediata e imprevisível.

De acordo com a denúncia do MP, a situação crítica de segurança e estabilidade da barragem era conhecida e debatida por consultores técnicos, representantes da empresa Vale S/A e, especialmente, por representantes da empresa Tüv Süd há mais de um ano antes do rompimento.

Segundo o MP, mesmo cientes das apontadas anomalias e do fator de segurança alarmante para liquefação da Barragem I, os responsáveis pelo empreendimento optaram por manter as operações ativas, deixando de adotar medidas necessárias para a estabilização das estruturas da barragem e para evitar mortes no caso de rompimento, o que veio a ocorrer.

Em sua denúncia, o MP sustentou ainda que, no ano de 2018, a Tüv Süd praticou ato lesivo à administração pública do Estado de Minas Gerais, dificultando a atividade de fiscalização do órgão ambiental estadual ? a Feam ? e de outros órgãos estaduais e do próprio Ministério Público.

Isso se deu pelo fato de a empresa emitir e apresentar Declaração de Condição de Estabilidade (DCE) da barragem que se rompeu, apesar de conhecer as anomalias e condições da estrutura que inviabilizavam atingir os fatores de segurança mínimos e necessários para garantir a segurança e a vida das pessoas.

Entre outros pontos, o MP alegou que provas colhidas com o apoio da Força Tarefa Estadual interinstitucional integrada pelas Polícias Civil e Militar, demonstram que funcionários da Tüv Süd se associaram para fraudar os relatórios de estabilidade da Barragem B1, do Complexo Córrego do Feijão, e dificultar a atuação dos órgãos estaduais de investigação e fiscalização.