Tribunais de Contas do Brasil tem utilizado a inteligência artificial (IA) para auxiliar na fiscalização de contas de governos e prefeituras, o que pode levar à economia em contratos, denúncias de irregularidades e, finalmente, à transparência perante a sociedade, segundo avaliação da Associação dos Membros de Tribunais de Contas do Brasil (Atricon).
O presidente da Atricon, Fábio Túlio Filgueiras Nogueira, também conselheiro do Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE-PB), avalia que a proliferação de inovação tecnológica propiciou a presença de mecanismos de inteligência artificial no âmbito da administração pública, sobretudo nos tribunais de contas. Segundo ele, as normas brasileiras de auditoria do setor público já preconizam o valor e benefício que essas ferramentas proporcionam.
“Praticamente todos os tribunais de contas do Brasil investiram muito em inteligência artificial, um dos ramos da ciência da computação que busca símbolos computacionais e que criam mecanismo que simulam a capacidade humana de pensar e resolver problemas, esse é o grande desafio, o uso de técnicas de inteligência artificial para subsidiar ações de controle”, disse.
Para ele, a implementação de medidas voltadas à gestão de informações estratégicas, usando ferramentas de inteligência, podem ajudar no tratamento de grandes massas de dados. “Hoje os tribunais de contas do Brasil são depositários do maior acervo de informações referente ao setor público, à administração pública. Não adianta ter um acervo expressivo se não tem instrumentos, ferramentas, tecnologia suficiente para fazer bom uso desses dados.”
Nogueira afirma que os tribunais de contas do país têm investido no desenvolvimento dessas ferramentas, feitas por técnicos das próprias cortes de contas e também em parceria com a academia. “Os tribunais desenvolveram equipes de TI e os exemplos são expressivos no Brasil inteiro, porque o volume de dados é tão grande, então você tem que criar ferramentas que estabeleçam determinadas malhas”, disse.
Ele explicou que, se a ferramenta aponta alguma eventual distorção de determinado procedimento, aquele procedimento automaticamente já cai naquela malha, como um sinal de alerta. “Com isso, a gente ganha tempo, otimiza a fiscalização. Aqueles processos que as ferramentas não conseguem identificar nenhuma irregularidade, eles tramitam sem prejuízo, sem perda de tempo, para que outros casos sejam analisados.”
Exemplos
Um dos exemplos citados pela Atricon ocorreu no estado de Goiás, em que uma ferramenta de inteligência artificial foi utilizada pelo Tribunal de Contas do Estado para a análise de dados e acabou identificando gastos de publicidade em outras dotações. Esse mecanismo possibilitava que os gestores afirmassem que gastavam uma quantia em saúde ou educação, por exemplo, quando, na verdade, o gasto era direcionado para publicidade. A ferramenta de tecnologia pegou este truque.
O programa utilizado analisou 152 mil empenhos, identificando 124 com características de gastos com publicidade e propaganda classificados com natureza de despesa não relacionado diretamente a essa finalidade. Somados, eles tiveram valor total empenhado superior a R$ 13 milhões, para o período de 2015 a 2018, que na prática foi utilizado em publicidade e não na área para qual foi destinado oficialmente.
Já a plataforma Preço de Referência, lançada em abril deste ano e desenvolvida pelo TCE-PB em parceria com Universidade Federal da Paraíba e o governo do estado, possibilita a cotação de produtos. Segundo a Abricon, essa é a primeira ferramenta do país capaz de fazer cotações, em tempo real, de preços considerando os três perfis de consumidor: pessoa física, pessoa jurídica e órgãos públicos.
Desde seu lançamento, já foram gerados quase 5 mil Certificados Eletrônicos de Cotação – nome dado ao documento eletrônico contendo cotações de vários produtos de uma licitação. Para a entidade, isso demonstra que diversos órgãos e entidades públicas tem utilizado a ferramenta, que pode ajudar os gestores nos processos de compras com uma maior precisão na geração dos preços usados nos processos licitatórios.
As cotações de preços são geradas a partir do processamento de quase 1,4 bilhão de cupons e notas fiscais eletrônicas, considerando mais de 4 milhões de tipos de produtos distintos vendidos na Paraíba.
Segundo Nogueira, há a possibilidade de nacionalizar o uso dessa ferramenta por meio de articulação com o Tribunal de Contas da União (TCU). “Nós já fizemos reuniões técnicas [com o TCU] com o objetivo de tentar levar essa ferramenta para o Brasil inteiro, disponibilizar em todos os estados da federação, inclusive para o governo federal, para que possa servir de suporte ao gestor público, aquele que tem a obrigação de adquirir equipamentos e insumos”, disse.
“Um dos projetos da Atricon é o compartilhamento de experiências. Se o TCE da Paraíba desenvolveu uma ferramenta interessante, a gente põe no sistema e deixa à disposição de outro tribunal. Para economizar recursos e tempo. Às vezes o tribunal de São Paulo está desenvolvendo uma ferramenta ou tem a intenção de desenvolver uma ferramenta para tratar de determinado objeto e outro tribunal já tem”, acrescentou.
Edição: Aline Leal/AB